19 de fev. de 2009

Dezembro Fechado

Cidade Fantasma
10h30minhs da noite.
É uma noite terrivelmente quente e abafada. Verão. Moro numa cidade que chamo de Cidade Fantasma, é uma cidade que existe, mas parece não existir. É como uma imagem nublada que lembra um sonho fantasmagórico. Como todas as cidades do seu porte, ela está no mapa, mas poderia estar num filme que não existe. Ninguém, ou quase ninguém sabe disso, eu sei, e um ou dois amigos meus também sabem. Nós vagamos por ela. Eu vago, sabendo que ela nunca deixará de ser o que é.
Deixou a camiseta jogada sobre o sofá e ando com o peito nu e uma jeans até a janela do apartamento. Não sei explicar mas idiotamente naquele momento me sinto como um caubói quase invencível. Não há motivos para me sentir assim, não consigo terminar a Q que estou desenhando, o traço está trancado, não consigo transpor para o papel as imagens que crio em minha cabeça. A história trava, cheguei a um ponto que ela não se desenvolve mais, não sei mais como continuá-la. No exato momento sou o maior fracassado, dívidas, um emprego miserável numa micro-agência de propaganda, e tenho tanto sucesso e habilidades com as mulheres quanto um cacto espinhento e sem flores teria com alegres e coloridas borboletas. Mesmo assim sinto-me como um caubói imbatível.

Há pouco mais de um mês aluguei esse pequeno apartamento num bairro que se chama Cidade Baixa. No mesmo prédio, no mesmo corredor, moram um escritor que luta para terminar um romance que está escrevendo a dois anos, no apartamento 208 mora uma garota que chega junto com os primeiros raios de sol que despontam pela manhã, no 202 uma mulher que aparenta ter quarenta e cinco anos e seu filho garoto adolescente. No mais, apenas apartamentos vazios e outros fantasmas.
10h30min min. Da noite.
Porto Alegre – Cidade Fantasma.
O telefone toca, trago o cigarro pela última vez ao ouvir o toque do telefone. Trago como se fosse à última tragada, a última saboreada, o último cigarro antes de me dirigir para cadeira elétrica. Uma gostosa tragada.
- Alô – eu digo
- Suzana?
- Quem?
- Suzana, posso falar com Suzana?
- Não existe nenhuma Suzana aqui – respondo.
- Como não, ela me deu esse número...

- Não existe ninguém aqui com esse nome. Não mora nenhuma mulher aqui.
- Ela me deu esse número. Disse que eu poderia ligar, que não haveria problemas. Ela marcou comigo, de aparecer aqui e não veio.
Desligo o telefone.
O telefone toca novamente alguns segundos depois. Uma, duas, três vezes. Não atendo imaginando que seja a mesma pessoa, o mesmo fantasma. O mesmo cara que não conheço e que sinto raiva por sua insistência. Lembro de uma mulher, uma louca que andava pelas ruas da Cidade Baixa, tinha olhos azuis. Era uma Kill Bill. Que vestia uma malha amarela colada ao corpo, tinha pernas ágeis e bonitas, e penso, seria capaz de acabar com um homem em minutos.
É dezembro e não me importa. É um dezembro fechado.

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